Camões Filho
5 de dezembro é o aniversário da nossa querida Taubaté. São 368 anos de história e de conquistas. E poucas cidades têm tanto a comemorar como Taubaté. Afinal, aqui é a terra de Monteiro Lobato e Mazzaropi, dois consagrados cultores da alma popular. Temos um bairro todo voltado para a arte, a Imaculada, reduto de figureiros maravilhosos, artistas que passam para o barro nossas histórias, causos, raízes, tradições.
Taubaté, parodiando Fernando Pessoa, não é a melhor cidade do mundo. Mas como aqui nasci e aqui vivo, Taubaté é a melhor cidade do mundo. Aqui nasceram meus filhos e aqui vivi a vida toda. Pode parecer piegas, mas adoro esta cidade e nunca quis daqui sair, apesar de inúmeras oportunidades que me surgiram ao longo de minha carreira de jornalista profissional.
Sou sessentão e, portanto, de um outro tempo, uma outra Taubaté. Aquela Taubaté gostosa, quando a gente saía e podia deixar a porta aberta. O máximo que podia acontecer era um vizinho invadindo nosso quintal para um dedo de prosa ou para emprestar uma xícara de pó de café.
Nós, jovens, íamos nos bailinhos da Associação e voltávamos de madrugada, caminhando contra o vento, felizes e envoltos em todos os nossos sonhos.
Nossos pais ou irmãos mais velhos trabalhavam na CTI, na Juta ou na Embaré, cuja chaminé, marca de uma era, foi derrubada pela insensatez dos poderosos que destroem nossa história com uma volúpia impressionante.
O nosso querido E. C. Taubaté tinha seu estádio ao lado do Bosque, onde preguiças se exibiam beeeeeeeeem devagar para as pessoas. Taubaté que ganhou o apelido de “Burro da Central”. Um dia recebi um amigo e o levei para assistir a uma partida do nosso alvi-azul. Ele ficou surpreso quando viu nosso time entrar em campo, com a torcida gritando “Burro... Burro...” Tive que explicar que os torcedores não estavam apupando o time ou o técnico, chamando-os de Burro. Aquilo era uma exaltação.
Naqueles velhos idos a gente tomava laranjada com croquete no Bar Bello, enquanto líamos “A Gazeta Esportiva”, que tinha suas páginas estrategicamente dependuradas nas paredes. Ou então íamos comer quibe do Bar Pilar, o mais delicioso do mundo. Sorvete tinha de ser da Sorveteria Raphael. Aos sábados, pizza no Restaurante Santa Terezinha.
Sábado era sagrado: rodar o Mercadão e a Feira da Breganha e depois parar na pastelaria, para comer pastel de carne e tomar laranjada. Breganha onde até hoje desfilam os mais curiosos e folclóricos tipos. Lá tem cada história. Um dia dois sujeitos fizeram uma troca curiosa: bicicleta por dentadura. Sabendo disso, escrevi essa quadrinha: “Na Breganha de Taubaté / Troca-troca pouco dura / O da bicicleta fica a pé / O banguela de dentadura”.
Nos domingos tinha matinê com filme de faroeste e seriado no Cine Palas ou no Boa Vista. À noite, na sessão das sete do Palas, os jovens lotavam o cinema. Quem não comparecia, ficava sem assunto a semana toda. A gente ficava jururu nos corredores do Estadão, onde o uniforme era um jaleco branco.
Depois do filme, tinha a paquera, o tradicional footing, que ia do Palas até a praça da Catedral. Os rapazes ficavam nas calçadas e as moçoilas desfilavam com suas saias plissês rodadas. Ali nasciam todos os namoros e futuros casamentos, numa Taubaté que tinha alma e aura de felicidade.
Assim era Taubaté. Terra que viu nascer Cid Moreira, apresentador por três décadas do Jornal Nacional da TV Globo, Hebe Camargo, a saudosa rainha da televisão brasileira, Celly Campello, a rainha do rock nacional, Monteiro Lobato, maior autor brasileiro de literatura infantil. Ou de personagens menos gloriosos, mas mais folclóricos, como Júlio Guerra, que tinha como plataforma de candidato a vereador trazer uma das praias de Ubatuba para Taubaté. Ou Dito Martelo, que se consagrou como o maior mentiroso dessas paragens.
Cidade onde Renato Teixeira iniciou sua notável carreira de cantor e compositor, onde compôs os versos imortais de “Romaria”. Onde Mazzaropi morou, montou sua produtora, a PAM, e fez filmes maravilhosos e inesquecíveis, nos quais desfilavam grandes artistas nacionais ao lado de gente da terra, como “Uma pistola para DJeca”, onde nosso amigo Luiz Homero brilha como advogado. Sem contar Nhô Tide, Chico Frô, Nhá Barbina, Zé Cocão, nossos grupos de congada, jongo, moçambique.
Taubaté de nossa Unitau com dezenas de cursos universitários, nossa indústria, onde são fabricados desde um simples botão até os mais modernos e avançados automóveis, celulares, TVs de LED. Taubaté de nossa história, nossas tradições, nosso folclore, especialmente o pavão, obra-prima de nossas figureiras da Imaculada, símbolo do artesanato paulista. Taubaté e seu Mercadão e a Feira da Breganha, local ideal para comprarmos frutas e verduras fresquinhas, encontrar os amigos, fazer umas trocas. Ali ao lado, a Bica do Bugre, lugar encantado. Quem toma de sua água, diz a antiga lenda, nunca mais vai embora de Taubaté.
Taubaté mudou completamente. Acredito que em muitos aspectos, para melhor. Orgulhamo-nos desta cidade, com índices de qualidade de vida de primeiro mundo, sem tanta violência, com escolas, universidades, indústria e comércio que fazem dela um destaque nacional.
Isso tudo sem perder suas raízes, sua história, seu jeitão folclórico, que nós taubateanos adoramos!
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Camões Filho, jornalista, escritor e pedagogo, pós-graduado em Jornalismo e Assessoria de Imprensa, é membro titular da Academia Taubateana de Letras. E-mail para contato com o autor: camoesfilho@bol.com.br