Em 11 de novembro, milhões de consumidores chineses farão compras online durante um evento chamado 11.11 Shopping Festival. Para aqueles no Ocidente que já ouviram falar nisso, essa mega- liquidação anual de 24 horas no feriado chinês do Dia dos Solteiros promovida pelo gigante do e-commerce Alibaba Group (meu empregador) vem despertando muita curiosidade devido a sua escala monumental.
Se você acha que a Cyber Monday ou a Black Friday são as maiores corridas às compras do mundo, está enganado. No ano passado, clientes online nos Estados Unidos gastaram US$3,64 bilhões no Dia de Ação de Graças, na Black Friday e na Cyber Monday combinados, de acordo com estatísticas da comScore, uma empresa que faz análises de dados da internet norte-americana. Já no Festival de Compras de 11 de novembro da China - o maior dia de compras online do país - Taobao Marketplace e Tmall.com, sites do Grupo Alibaba, processaram mais de US$5,75 bilhões em vendas. Ou seja, quase um terço a mais do que as três maiores datas de corrida às compras dos EUA combinadas, num período de 24 horas.
O fato de os consumidores chineses terem facilmente ultrapassado os americanos num quesito em que estes sempre se destacaram — gastar dinheiro — é um exemplo contundente da cultura de consumo única que se desenvolveu na China e que tem sido frequentemente mal interpretada pelas empresas ocidentais interessadas em fazer negócios no país.
Em primeiro lugar, na RPC a atividade de comprar online é considerada muito mais importante do que no Ocidente, conforme mostrou o volume de vendas durante o 11.11. No entanto, diferente do que ocorre nas economias mais maduras, comprar online ainda é uma atividade relativamente nova entre os consumidores cada vez mais endinheirados na China. Mais da metade dos consumidores online do país fizeram sua primeira compra pela internet nos últimos quatro anos. No entanto, estes novatos não fazem parte de um grupo seleto. No início de 2014, aproximadamente 300 milhões de chineses fizeram compras online – um número tão alto que se fosse um país, seria o quarto maior do mundo. Nos próximos anos, esta nação de consumidores online deverá dobrar de tamanho.
Isso já é motivo suficiente para nós tentarmos entender as idiossincrasias no comportamento dos compradores chineses. Veja a seguir algumas diferenças básicas entre os consumidores chineses e os ocidentais:
O ato de comprar os deixa muito felizes.
A sensação de que fazer compras é uma atividade agradável ao invés de uma obrigação é muito mais forte entre consumidores chineses do que entre americanos ou britânicos, segundo um relatório publicado pela empresa de pesquisa Millward Brown. De acordo com os resultados da pesquisa, 68 por cento dos entrevistados chineses afirmaram sentirem-se “felizes ou incrivelmente felizes” ao fazer compras, comparado a somente 48 por cento dos entrevistados americanos e 41 por cento dos britânicos que deram a mesma resposta. Os compradores chineses também são mais empenhados que os americanos ou os britânicos em pesquisar com antecedência informações sobre os produtos que desejam comprar, segundo a Millward Brown.
Eles são compradores Omni-channel.
Embora gostem de olhar vitrines como todo mundo, os chineses não gostam tanto de comprar em lojas físicas quanto os consumidores no Ocidente. Segundo uma pesquisa recente feita pela PricewaterhouseCoopers (PwC) com mais de 15.000 compradores online no mundo todo, 75 por cento dos entrevistados chineses afirmaram comprar online semanalmente comparado à média global de 21 por cento.
Na China, a tecnologia faz parte integral do processo de fazer compras, que por sua vez frequentemente incorpora mídias sociais, smartphones, tablets e PCs nas tomadas de decisão e no ato de comprar. O país é líder mundial em compras por celular: mais de três em cada quatro consumidores chineses já fizeram compras por celular comparado à média global de 43 por cento, de acordo com os resultados da pesquisa feita pela PwC. Ainda mais significativo é o fato de que um em cada quatro consumidores chineses afirmou fazer compras pelo celular pelo menos uma vez por semana. A média global é de apenas 9 por cento.
Embora eles adorem uma pechincha, o preço já não é um fator tão importante.
Alguns anos atrás, os consumidores chineses diziam que os preços mais baixos eram o principal motivo para comprar online. Hoje em dia, as razões que os levam a escolher um ou outro canal de compras já não são tão claras. Segundo um relatório recente publicado pela Oracle, 82 por cento dos consumidores chineses entrevistados disseram que a disponibilidade de produtos é mais importante que o preço, enquanto que quase 100 por cento afirmou que os vendedores deveriam adotar novas tecnologias para melhorar a experiência de fazer compras.
Eles são mais exigentes.
Os compradores no Ocidente pressupõem que os sites de compras que eles visitam são confiáveis e os produtos são de boa qualidade. Porém, na China não é bem assim. É comum a venda de produtos falsificados, mal feitos e não seguros e a ocorrência de fraude online. O governo chinês estima que quase uma em cada três pessoas que compram online regularmente já foi ludibriada por sites enganosos.
Por isso, os consumidores chineses requerem maior cuidado e garantias ao fazer compras e tendem a ser mais exigentes em relação às informações sobre produtos e vendedores do que os compradores em outros países. Pensando nisso, Taobao Marketplace e Tmall.com, dois e-marketplaces gigantes pertencentes ao Grupo Alibaba, disponibilizam sistemas de pagamento online com serviços de depósito de garantia e serviços de mensagem instantânea para que os compradores possam se conectar diretamente e em tempo real aos vendedores para esclarecer dúvidas sobre tamanhos, frete e outros assuntos.
Na verdade, quase nove entre dez compradores online chineses acham que os serviços online deveriam ser criados sob medida pelos vendedores para atender as suas necessidades individuais. Isto é muito diferente do comportamento dos consumidores ocidentais, que aceitam com maior facilidade os sites de compras self-service e de produtos com tamanho único, e tendem a entrar em contato com os vendedores somente quando ocorre algum problema.
Eles seguem as mídias sociais e as opiniões dos amigos sobre os produtos.
Mais do que outros consumidores no resto do mundo, os consumidores chineses dependem muito das recomendações sobre produtos feitas por avaliadores online. Antes de fazer compras, consultam as opiniões de seus amigos nas redes sociais. Peter Stein, CEO global da Razorfish, apontou essa diferença tão importante numa coluna recente na revista Forbes, onde afirmou que 75 por cento dos internautas chineses postam feedbacks online sobre suas compras pelo menos uma vez por mês comparado a menos de 20 por cento nos EUA. “Hoje em dia, há mais de 300 milhões de pessoas [na China] que só compram um produto após receberem o aval de seus pares nas mídias sociais ou em fóruns de e-commerce,” escreveu Stein, concluindo que as mídias sociais são “um elemento essencial para o sucesso das marcas chinesas.”.
Eles preferem marketplaces a sites de compras independentes.
No Ocidente, a maior parte das compras online é feita em sites de varejistas tradicionais (“clicks and bricks”) ou de produtos exclusivos. Na China, aproximadamente 90 por cento do e-commerce ocorre em e-marketplaces - agrupamentos de lojas virtuais de milhares de vendedores independentes que contam com o suporte de provedores de serviços terceirizados, tais como empresas de entrega. Os varejistas ocidentais que tentaram introduzir sites independentes no mercado chinês obtiveram resultados de vendas decepcionantes devido à dificuldade em atrair compradores.
Eles gostam de marcas, mas não são muito fiéis (ainda).
Assim como no Ocidente, os consumidores chineses abastados conhecem e desejam adquirir marcas de luxo como um símbolo de status. No entanto, nas compras do dia-a-dia a sua fidelidade ainda deixa a desejar. Como o conceito de marca ainda é relativamente novo na China, os consumidores ainda não criaram uma história de afinidade com marcas famosas. No entanto, isso não significa que as marcas de produtos do dia-a-dia não sejam importantes. Segundo a consultora Bain & Co., a marca é um dos principais fatores na compra de qualquer tipo de produto pelos consumidores chineses. Os padrões de compra observados na Tmall.com, o maior site de venda de produtos de marca autênticos da China, demonstram que os consumidores buscam marcas importadas por vários motivos, incluindo melhor qualidade, segurança do produto, falta de disponibilidade no mercado doméstico e preços mais baixos.
Segundo a Bain, embora os consumidores chineses apreciem marcas famosas, ao fazer uma compra eles não necessariamente procuram uma marca específica. Ou seja, o país é um terreno fértil para marcas locais e estrangeiras cultivarem laços mais fortes por meio de ações de marketing eficazes.
Devido à língua e à cultura, o mercado consumidor chinês ainda é considerado intimidador. No entanto, apesar disso ele possui mais similaridades do que diferenças em relação a outros mercados.
Assim como os consumidores americanos e europeus, os consumidores chineses querem se sentir especiais. Eles querem experimentar o que o mundo tem para oferecer através de seus produtos e desfrutar das oportunidades de conhecer esses produtos de forma sofisticada – uma função que o ambiente de vendas online pode desempenhar como ninguém.
Embora o conceito de fidelidade de marca ainda não tenha se solidificado no país, esse processo já está em vias de implementação. Através de ações de marketing e merchandising inteligentes, aplicadas e sensíveis às diferenças culturais, empresas do mundo todo poderão se tornar marcas reconhecidas no país que sedia o feriado com a maior corrida às compras do planeta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário