segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Tela mágica


Camões Filho

O tempo não pára, já cantava Cazuza. E nessa corrida tresloucada, as novidades tecnológicas que surgem a cada dia transformam em verdadeiras peças de museu aquilo que até ontem era moderno. Veja o exemplo do videocassete, que aqui no Brasil surgiu lá nos anos oitenta do século passado. Foi um furor. Todo mundo queria ter um, para assistir em casa os filmes que antes só se viam no cinema. Taubaté não tinha então mais nenhum cinema, não havia ainda TV a cabo, e tudo isso contribuiu para que o videocassete passasse a ser o objeto de desejo de todos os cinéfilos.
         Meu primeiro vídeo foi um daqueles G-9. Pesava uns dez quilos. Nos primeiros anos, pegava filme todo dia na locadora do Roberto, que ficava ali pertinho da Prefeitura, em frente do antigo Banco de Sangue. Em três anos eu assisti mais de mil filmes. Percorri toda a filmografia mundial. Revi todos aqueles filmes que curtia nos velhos cinemas de Taubaté: Palas, Metrópole, Urupês, Odeon e Boa Vista. O que gastei com aluguel de fita dava para comprar um Fusquinha meia-meia.
         Um dia peguei para ver o clássico “Casablanca”. Tinha um amigo, o jornalista Lázaro Macedo, com quem trabalhara no ValeParaibano, que amava este filme. Preparei uma verdadeira sessão de cinema à noite em casa, com direito a pipoca com guaraná. Nos reunimos na sala e apertei o play.
         Foram, a seguir, duas horas de sonho e entretenimento. O Lazão, que era muito emotivo, chorou feito criança com o romance vivido por Rick e Ilsa, interpretados por Humfhrey Bogart e Ingrid Bergman. A história se passa na Segunda Guerra Mundial. Enquanto cidades são invadidas pelos alemães, eles conseguem viver um romance intenso e inesquecível em Paris. O que torna a história mais interessante é exatamente a impossibilidade deste amor continuar. O roteiro e os diálogos do filme, dirigido por Michael Curtiz em 1942, são perfeitos nesse sentido. llsa, a bela atriz sueca lngrid Bergman, apaixona-se por Rick, o charmoso galã Humphrey Bogart, mas, em vez de fugir com ele de Paris, manda-lhe um bilhete de despedida na estação de trem. Ele parte sem entender o que havia acontecido. Tudo isso é contado em flashback. Anos depois já em Casablanca, na Marrocos francesa, ela aparece com seu marido, o herói Victor Laszlo, interpretado pelo ator Paul Henreid, justamente no Rick's Bar, do qual o personagem de Bogart é dono. Eles estão à procura de um meio de fugir para a América. O sofrimento de Rick ao vê-la é inevitável e ela fica novamente dividida entre seus dois amores. O sucesso do filme, que até hoje continua ganhando muitos fãs de todas as gerações, explica-se pela fórmula bem dosada de romance, humor, intriga e suspense.
O pano de fundo para o romance vivido por Rick e llsa não poderia ser mais tenebroso, com os estrondosos canhões nazistas que invadiam Paris. Logo no começo do filme, dois soldados alemães são assassinados no trem e as suspeitas da polícia recaem sobre os traficantes de vistos de saída. Um deles é detido em pleno Rick's Bar e morto ao tentar escapar. O clima volta a ficar tenso quando o líder da resistência francesa Victor Laszlo desafia os nazistas cantando o hino da França, A Marselhesa, encobrindo a cantoria embriagada dos soldados nazistas. No final do filme, o capitão Renault – um personagem bonachão e corrupto -  joga a garrafa de água Vicky no lixo num claro protesto contra o protecionismo francês. Caminhando na noite de Casablanca, Rick, diz a ele a célebre frase final do filme: “Isso é o começo de uma grande amizade”.
Todo admirador desse filme curte a música tema, “As time goes by”, que Sam, interpretado pelo ator Dooley Wilson, toca para o romântico casal em Paris e, depois, é forçado a repetir para os saudosos amantes. Um dos momentos mais emocionantes do filme acontece depois que lisa reconhece Sam no Rick's Bar e pede para ele tocar essa música: “Toque outra vez, Sam, toque a nossa música”.
O emotivo coração do amigo Lazão não suportou todas as emoções de uma vida tão atribulada quanto a de Rick. Anos depois, ele foi operado, botou cinco pontes de safena, até que um dia ele partiu e nos deixou. Como diria Guimarães Rosa, encantou-se...

        
---------------------------

 Camões Filho, jornalista, escritor e pedagogo, é membro titular da Academia Taubateana de Letras.
E-mail para contato com o autor:  camoesfilho@bol.com.br



Nenhum comentário:

Postar um comentário