segunda-feira, 24 de março de 2014

Contrato verbal de franquia e suas consequências

Daniel Alcântara Nastri Cerveira*

A relação de franquia é estabelecida por meio de contrato celebrado entre o franqueador e franqueado, no qual são dispostas todas as condições e regras a serem seguidas pelas partes. Por outro lado, é comum a existência e regular operação de unidades franqueadas, sem qualquer documento escrito assinado entre o franqueador e franqueado, inclusive em franquias tradicionais, seja por acordo comercial ou por falha administrativa.

Vale ressaltar que a Lei Brasileira de Franquia, em seu artigo 4º, determina que a circular de oferta de franquia deverá ser entregue pelo franqueador ao candidato a franqueado, com a antecedência mínima de 10 dias antes do pagamento de qualquer taxa por este, ou da assinatura do (pré) contrato de franquia - e esta circular deve vir acompanhada do modelo-padrão do (pré) contrato de franquia. O parágrafo único do mesmo artigo, por sua vez, prevê que o não atendimento da referida obrigação legal acarretará, a critério do franqueado, na anulação do contrato de franquia, e possibilitará exigir a “devolução de todas as quantias que já houver pago ao franqueador ou a terceiros por ele indicados, a título de taxa de filiação e ‘royalties’, devidamente corrigidas, pela variação da remuneração básica dos depósitos de poupança mais perdas e danos”.

Com efeito, o artigo 6º dispõe que o “contrato de franquia deve ser sempre escrito e assinado na presença de duas testemunhas”, nada sendo disposto sobre as consequências na hipótese de inobservância da previsão. Diante da redação da lei, é inegável a lacuna da legislação, o que acarreta interpretações divergentes. Por exemplo, uma possível linha de raciocínio seria no sentido de que, nos casos em que foi entregue a circular de oferta, porém não foi assinado o contrato de franquia, igualmente o franqueado poderia se valer da sanção prevista no parágrafo único do art. 4º (anulação e ressarcimento dos valores pagos, mais perdas e danos).

A própria interpretação e aplicação do parágrafo único do artigo 4º acima mencionado, que trata da anulação do contrato, ainda é objeto de dúvidas, sendo carente de consolidação doutrinária e jurisprudencial. Neste cenário, e corretamente, os nossos Tribunais vêm julgando as demandas do gênero com base na análise “caso a caso”, dentro dos elementos fáticos concretos de cada situação, admitindo-se, como regra, a relação de franquia oriunda de contrato verbal.
Assim, muito embora uma relação de franquia seja plenamente possível de prosperar e perpetuar juridicamente e comercialmente, a recomendação, tanto para os franqueadores quanto para os franqueados, é evitar tais situações, por diversos motivos.

Sob o ponto de vista do franqueador (e de toda a rede de franquia respectiva), a ausência de contrato escrito é prejudicial, pois, a princípio, o impede de obrigar o franqueado a seguir as normas do sistema, como restrições quanto aos produtos a serem comercializados pelas unidades franqueadas, regras de não concorrência, política de preços, entre outras. Ademais, somente com o instrumento firmado é possível estabelecer uma garantia para o pacto de franquia. Do lado do franqueado, igualmente é extremamente desinteressante manter contratos não escritos ou verbais, vez que também trará como resultado a impossibilidade deste exigir do franqueador que cumpra com os seus deveres (como, por exemplo, direito de preferência ou exclusividade de atuação em uma determinada área geográfica).

Ainda, em se tratando de contratos verbais de franquia, entende-se que o prazo contratual é o indeterminado, isto é, a qualquer momento, qualquer um dos contratantes pode rescindir o acordo, sem ficar sujeito a qualquer penalidade.
Note-se que o Código Civil, no parágrafo único de seu artigo 473, estabelece que, em decorrência da natureza do contrato, se uma das partes “houver feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos investimentos”. Esta norma em tese pode ser utilizada para evitar a rescisão prematura de um acordo verbal de franquia, caso um dos contratantes haja realizado investimentos significativos no negócio.

De todo modo, o fato é que a inexistência do contrato escrito gera muita insegurança a todos os interessados, na medida em que franqueado e franqueador podem pedir sua rescisão a qualquer momento, ao mesmo tempo em que surgem inúmeras dificuldades para demonstrar quais são as obrigações de cada um. É sempre recomendável, portanto, seguir as orientações da Lei de Franquia, e estabelecer um contrato escrito e bem elaborado, de modo a evitar conflitos futuros.

* Daniel Alcântara Nastri Cerveira é advogado,  sócio do escritório Cerveira Advogados Associados, professor de pós-graduação do Curso de Direito Imobiliário da PUC/RJ e pós-graduado em Direito Econômico pela Fundação de Getúlio Vargas de São Paulo (FGV/SP)– daniel@cerveiraadvogados.com.br

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