quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

USP, crise e consciência

É um truísmo destacar a relevância da USP para a educação de São Paulo, do Brasil e da América Latina. Talvez seja uma das poucas instituições, nesse espaço, em que se perfaz o conceito correto de Universidade. Complexo de ensino superior que não se restringe a professores e alunos, uns perorando e outros ouvindo.

Engloba os centros de pesquisas científicas, as interações multidisciplinares, faz arrancar a tecnologia e, consequentemente, o desenvolvimento, cultua a memória histórica com museus, mantem hospitais de primeira linha para atendimento, sobretudo, da população mais carente, forma pensamento crítico que se adensa no seio da comunidade etc, como, de resto, é dever de todas as melhores universidades do mundo.

Logo, não podemos ser indiferentes à crise financeira estrutural que abala a USP. Principalmente, seus ex-alunos, em expressiva maioria conquistadores de um lugar ao sol nesta sociedade brutal.

Segundo reportagem de O Estado de São Paulo de 6 de dezembro/14, a USP deve gastar R$ 988 milhões a mais do que recebe. A previsão do deficit para 2015 é de R$ 1,1 bi. Trata-se da maior crise da Universidade em 30 anos. A instituição vive de parcela fixa que recebe do ICMS. Nada de errado,posto que os impostos devem servir a educação de qualidade.

No entanto, há que fazer mais. O sistema de financiamento por pessoas físicas e jurídicas que devem sua existência ao saber colhido na Universidade de São Paulo, por meio de doações regulares, foi adotado pela Poli há alguns anos, mas não há informações sobre seus resultados. Trata-se de uma retribuição daqueles que ocupam posições sociais vantajosas graças à USP. Não se trata de ensino pago, de pagamento obrigatório após a conclusão do curso, mas de contribuições voluntárias feitas por aqueles que, dos ensinamentos hauridos na graduação e pós-graduação, conquistaram seus objetivos e, não raro, posições extremamente privilegiadas no mundo contemporâneo. Harvard, privada, tem suas receitas robusteciadas em quase 60% por esse tipo de aporte, que é comum nos EUA e faz parte do espírito americano; as doações dos ricos não são esmolas e tampouco devem ser rejeitadas como o fazem fundamentalistas que não querem pressupor uma sociedade composta de ricos e pobres. O problema é que essa sociedade é real.

A reportagem mencionada traz um dado risível. Para combater o mencionado deficit, pensa-se em vender imóveis avaliados em R$ 50 milhões. Aspirina para o câncer. Por outro lado, pensa-se em instaurar um sistema de demissões voluntárias entre os servidores. É dizer, pensar em mudar para melhor a coluna das receitas é utópico, elucubração imatura. Só há saída no método tradicional de emagrecer a coluna das despesas.

A ordenação do ex-alunos da USP no interior de pessoa jurídica adequada, por incentivo da Reitoria e do Conselho Universitário, com propósitos permanentes, certamente mobilizaria grande aporte de recursos alocados com gosto, o que teria, ademais, a virtude de criar no "ethos" da elite intelectual do Brasil o apreço pela transferência de uma parcela de seus rendimentos, sem nenhuma contrapartida, à instituição pública que foi seu esteio passado e seu vetor do presente e futuro, que um dia soube reconhecer os méritos pessoais de seus integrantes e os acolheu, tornando-os aptos aos desafios de um capitalismo ainda selvagem. Não haverá sanção pelo descumprimento das obrigações, que se devem plasmar exclusivamente no campo de uma nova moral, para os bem-formados mais coativa que as normas jurídicas.

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